terça-feira, 21 de agosto de 2012

A Vida Sem Rodinhas.


A Vida Sem Rodinhas.









Lembro dos momentos importantes da infância, e também do desimportantes, meu pai estava a postos empunhando uma máquina fotográfica. A consequência? A cada gaveta que eu abro em casa, saltam fotos diversas, sem contar as estão confinadas em álbum e porta-retratos. Dessas tantas, há uma pela qual tenho um carinho especial: é uma foto que estou andando de bicicleta, ao cinco ou seis anos de idade. Naquele dia eu andei sem rodinhas pela primeira vez. Dei várias voltas sem cair, até que meu pai clicou o flagrante: a pirralha com a maior cara de vencedora, dona do campinho, se achando. Eu realmente estava degustando aquela vitória.
Se a foto tivesse legenda seria “Viu”
As rodinha são um base protetora para iniciantes, uma segurança para quem ainda não tem domínio da coisa. Que coisa. Qualquer coisa. Me corrija se eu estiver errada: a gente usa rodinha até hoje.
Quando se escreve um livro, por exemplo, as rodinhas são as cenas não inventadas, o sentimento de verdade, vivido com qual a  gente ampara a ficção.
Quando tem filhos, as rodinhas são a herança da educação que nossos pais nos deram, a parte hereditária que, mesmo questionada, sustenta nossas primeiras decisões.
Quando nos apaixonamos, as rodinhas são a repetição de certos clichês, a partilha de nossos ideais e certezas, mesmo sabendo que em breve entraremos em terreno movediço, desconhecido.
Quando se aceita um novo emprego, as rodinhas são a nossa experiência anterior, o que facilita a arrancada, mas depois é preciso andar sozinho.
Viver sem elas torna tudo mais perigoso, vulnerável, e ao mesmo tempo, emocionante. Nos faz volta a ser criança: será que estou agindo certo, será que estou indo rápido, ou lento demais? Atenção: Lento demais, cai.
É preciso saber viver sem um suporte contínuo para que possa firmar o próprio caráter. Quem não sai da barra da saia da mãe nunca consegue se equilibra sozinho. Quem não soltada a mão do pai não vira homem.
Quando é que sabemos que estamos aptos a andar por nossa conta? Se  o assunto é bicicleta, aos cinco, seis, sete, até ao dez anos, dependendo do ritmo da estabilidade de cada um.


Quando se trata da vida, também depende. Mas usa-las para sempre nos impede de sentir o gostinho de conseguir, de vencer, de atingir nossos objetivos por mérito próprio.
 Nos impede de provocar: “Viu” .
Nada nos dá tanto orgulho do que mostrar aos outros  __ e a nós mesmo __o quanto podemos. 




Retirado do livro Feliz por Nada de  Martha Medeiros

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